sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Da nossa nudez

E a gente se expõe
de corpo inteiro.
E a gente se desnuda
prum mundo mundo
vasto mundo...
E compartilha 
dessa nudez de quem
apenas vive
e não desiste;

E digo mais:
A gente se entrega,
às vezes, sem
a menor cerimônia.
E depois chora
e se demora
mais um pouco
a passar...
A gente ora!

O que podemos
fazer? Se ser humano
é ser assim?
É se despir
de seus
conceitos,
é se expor
sem um
receio...

Às vezes machuca
e fica feio pra burro!
Ferida sangrando
por fora,
coração ardendo
por dentro.

Mas não há
outro jeito,
senão
subverter
todos os medos
e sublimar
todos as
nossas mágoas -
no travesseiro.

- À nudez nossa de cada dia, amém!

"e o que não é maleável deixa de ser nobre,
nem era amor aquilo que se amava.

Nem era dor aquilo que doía;
ou dói, agora, quando já se foi?
Que dor se sabe dor, e não se extingue?
(Não cantarei o mar: que ele se vingue
de meu silêncio, nesta concha.)"

Nudez

Carlos Drummond de Andrade

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Como um troféu

 ou Poesia do incômodo

Como um troféu,
você o pôs
na estante.

Expôs
e repôs...
expôs e repôs
no mesmo
instante.

Esperou o tempo pairar,
a poeira baixar
de vez naquela
prateleira.

Esperou o clamor
acabar, o grito se calar,
o choro secar, e o seu troféu,
enfim, empoeirar.

Está ali o seu troféu...
Já tão distante...
Tanto faz,
pouco importante...

Caminhão de mudança
estacionado no asfalto.
Coração abandonado
na estante.

Não cabera na caixa,
mas o projetara
naquele instante.
Não cabera na - nova - casa,
mas o proporcionara
aquele lance.

Como um troféu,
você se atreveu
a esquecê-lo
na estante...

(Sem supor
o que o
troféu
iria sentir.)

- Mas ele sentiu!

sábado, 15 de janeiro de 2011

...

Ah, o mar,
nós dois
uma vez
nesse
reencontro.
Espero
nas suas
águas
me
encontrar.

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Me vê a conta!

Pobre coração
assim aflito.
Quer ser
meu amigo?
Eu te mostro
um abrigo.

Da sua boca
as palavras
escorrem
feito lágrima.
Que agora
são várias.
E você nem
as enxuga.

Pobre coração
ágil, tão frágil
nesse contágio
improrrogável...

Você pede a conta:
- Por favor.
E a notinha
não vem,
o cartão
falha
e a máquina
agarra aquele
papelzinho.

Pobre coração
assim sozinho.
- Só.
Só precisa
de carinho.
- S...
Só quer
ficar juntinho.
- .
Só precisa
de um tempinho.

Quer se refugiar,
ficar segurosozinho.
Procura estar
assim, mais
alegrinho...
pra poder continuar
brincarjuntinho.

Pobre coração
avaçalado.
Há tempos você
vem meio calado...
Deve estar meio
cansado de
estar sempre
só – acompanhado.

domingo, 2 de janeiro de 2011

Naufrágio dezembro

Em 2009, pedi por um terremoto ao ano que se iniciava - 2010. Quis colocar um basta em toda mesmice e jogar fora todo aquele antiquário... Mal sabia eu que os meus desejos poderiam ser realizados. E veio o ano novo e fui atropelado. Cai estatelado no chão e os tremores atrapalhavam a minha subida. Houve um tempo em que eu preferi ficar quietinho, sem nada tentar... Esperando só as placas tectônicas voltarem ao seu lugar.
Era janeiro e passado o estresse do vestibular eu resolvi fazer as malas e viajar pra Pasárgada. Pensei em dar um tempo nesse blog, para me renovar. Inovar. Não que hoje eu esteja super satisfeito com os meus "posts" aqui do blog, mas eu queria elevar o nível. Ter um cuidado melhor com a palavra dita. 2010, nesses quase três anos de Meu Irritante Eu, foi o ano em que eu menos escrevi... Foi o ano que em que suprimi aquilo que, antes, me atrapalhava: Adeus, Irritante eu. Agora tudo é Meu!
Nesse cuidado com o texto, acabei por me aproximar da poesia. Maneira esplêndida de se escrever com muito esmero, de elevar o espírito, de se encantar com a vida passada à limpo nas palavras de um poeta. Daí fiz minha retrospectiva, dessa vez, estendendo todos os meus versos num varal, ops!, sarau. E enxerguei ali a história de um ano que não acabava mais, de um difícil dezembro que insistia em continuar a me afogar. O mar, na sua ressaca procurando me envolver naquela água, gelada! Já não me bastasse a boa parte dos 365 dias que passei remando contra a maré... E no fim, dezembro me afogou.
Surjo na praia, vejo que já é janeiro e nem sei bem quantas horas se passou. Só sei que em algum instante naufraguei. Aqui estou, 2011. E nesse recomeço, transcrevo poesia roubada da estante, poesia de um mestre que muito sabe da vida:

O Mundo é Grande

O mundo é grande e cabe
nesta janela sobre o mar.
O mar é grande e cabe
na cama e no colchão de amar.
O amor é grande e cabe
no breve espaço de beijar. 

Carlos Drummond de Andrade

- Adeus Pasárgada, adeus!